Fernando António Nogueira Pessoa (Lisboa, 13 de junho de 1888 — Lisboa, 30 de novembro de 1935) foi um poeta, filósofo, dramaturgo, ensaísta, tradutor, publicitário, astrólogo, inventor, empresário, correspondente comercial, crítico literário e comentarista político português.
Fernando Pessoa é o mais universal poeta português. Por ter sido educado na África do Sul, numa escola católica irlandesa, chegou a ter maior familiaridade com o idioma inglês do que com o português ao escrever os seus primeiros poemas nesse idioma. O crítico literário Harold Bloom considerou Pessoa como “Whitman renascido”, e o incluiu no seu cânone entre os 26 melhores escritores da civilização ocidental, não apenas da literatura portuguesa mas também da inglesa.
Das quatro obras que publicou em vida, três são na língua inglesa e apenas uma em língua portuguesa, intitulada Mensagem. Fernando Pessoa traduziu várias obras em inglês (e.g., de Shakespeare e Edgar Allan Poe) para o português, e obras portuguesas (nomeadamente de António Botto e Almada Negreiros) para o inglês.
Enquanto poeta, escreveu sob diversas personalidades – heterónimos, como Ricardo Reis, Álvaro de Campos e Alberto Caeiro –, sendo estes últimos objeto da maior parte dos estudos sobre a sua vida e obra. Robert Hass, poeta americano, diz: “outros modernistas como Yeats, Pound, Eliot inventaram máscaras pelas quais falavam ocasionalmente… Pessoa inventava poetas inteiros”. Buscou também inspirações nas obras dos poetas William Wordsworth, James Joyce e Walt Whitman.
1.Em todo o momento de atividade mental acontece em nós um duplo fenômeno depercepção: ao mesmo tempo que tempos consciência dum estado de alma, temosdiante de nós, impressionando-nos os sentidos que estão virados para o exterior,uma paisagem qualquer, entendendo por paisagem, para conveniência de frases,tudo o que forma o mundo exterior num determinado momento da nossapercepção.
2.Todo o estado de alma é uma passagem. Isto é, todo o estado de alma é não sórepresentável por uma paisagem, mas verdadeiramente uma paisagem. Há emnós um espaço interior onde a matéria da nossa vida física se agita. Assim umatristeza é um lago morto dentro de nós, uma alegria um dia de sol no nossoespírito. E — mesmo que se não queira admitir que todo o estado de alma é umapaisagem — pode ao menos admitir-se que todo o estado de alma se poderepresentar por uma paisagem. Se eu disser “Há sol nos meus pensamentos”,ninguém compreenderá que os meus pensamentos são tristes.
3.Assim, tendo nós, ao mesmo tempo, consciência do exterior e do nosso espírito, esendo o nosso espírito uma paisagem, tempos ao mesmo tempo consciência deduas paisagens. Ora, essas paisagens fundem-se, interpenetram-se, de modo queonosso estado de alma, seja ele qual for, sofre um pouco da paisagem queestamos vendo — num dia de sol uma alma triste não pode estar tão triste comonum dia de chuva — e, também, a paisagem exterior sofre do nosso estado dealma — é de todos os tempos dizer-se, sobretudo em verso, coisas como que “naausência da amada o sol não brilha”, e outras coisas assim. De maneira que aarte que queira representar bem a realidade terá de a dar através dumarepresentação simultânea da paisagem interior e da paisagem exterior. Resultaque terá de tentar dar uma intersecção de duas paisagens. Tem de ser duaspaisagens, mas pode ser — não se querendo admitir que um estado de alma éuma paisagem — que se queira simplesmente interseccionar um estado de alma(puro e simples sentimento) com a paisagem exterior. […]