Há tempos, os jornais de Nova Iorque publicaram o necrológio de um famoso jogador profissional, um desses homens que, passando a vida entre a roleta e o monte, com alternativas emocionantes de perdas e ganhos, obtêm do jogo o suficiente para não terem de pensar em se dedicar a ocupações mais decorosas.Os que tiveram oportunidade de conviver intimamente com tão original indivíduo afirmavam que ele dispunha dos dotes indispensáveis para poder orientar a sua conduta pelo caminho do dever, bem como do expediente, desembaraço e qualidades necessárias para se firmar e engrandecer na vida; mas que as suas energias, mal aplicadas, não deram o rendimento útil que delas era lícito esperar, e levaram-no à sepultura, deixando como única recordação da sua memória uma triste reputação de jogador afortunado.Aparte o vício, ou, digamos, a paixão, que sedutoramente o escravizava, era um homem honrado, tal qual se entende a honradez entre jogadores de ofício, e tinha talento, claro critério e um finíssimo instinto comercial, que lhe teriam assegurado a vitória em qualquer profissão. Além disso, era, por temperamento, um apaixonado pela beleza. O seu fraco era colecionar livros e obras-de-arte. As suas coleções afirmavam bem alto quão requintado era o seu gosto, e delicado o seu espírito.Com todos estes dotes pessoais que inutilizou no jogo, teria sido, se tivesse querido, um homem eminente no modo de vida que escolhesse; mas, por desgraça, afeiçoou-se aos dados, às cartas e às fichas, desde muito novo, desprezando as ocasiões que se lhe deparavam, de empregar judiciosamente as notáveis faculdades de que dispunha.Quinze dias após a morte deste afamado jogador, a imprensa de Nova Iorque dava conta da morte de outro personagem da sociedade nova-iorquina. Mas então: Que homem! Quão utilmente tinha empregado a vida! Que formoso caráter se havia afirmado! Que excelente reputação adquirira! Que preciosa herança legava à posteridade! Esse homem era João Muir, mal conhecido nos países europeus, onde a Fama somente apregoava “divulgava” o nome dos políticos e dos estadistas, deixando em silêncio o dos sábios, poetas e artistas que, se bem refletirmos, mais dignos são da imortalidade.Leia mais