O que a Esfinge ensina a Édipo de Juliana de Moraes Monteiro, originalmente sua tese de doutorado, vem agora a público como livro. Publicação merecida, combinando rigor acadêmico com uma escrita fluente. Partindo de suas leituras de Giorgio Agamben e Jacques Lacan, a autora toma a arte contemporânea como questão. Nada nela parece estável, sobram inquietação e desamparo. O que fazer diante de uma experiência que pode assumir toda e qualquer materialidade?Desde pelo menos A Fonte (1917), de Marcel Duchamp, a lida com a arte se dá no embate entre tudo ser possível e o susto do encontro poético. É um embate, jamais uma passagem do não-saber para o saber. Esse embate percorre a escrita deste livro e o diálogo fértil nele construído entre filosofia, psicanálise e arte.Tomar Duchamp como ponto de partida para o contemporâneo pode trazer problemas no que tange os parâmetros da história da arte, mas é totalmente legítimo para se pensar uma prática artística descolada dos domínios disciplinares ou da autorreferência dos meios-expressivos. Surgiria ali uma “virada-conceitual”, consolidada na década de 1960, que nada mais é que a aposta na inespecificidade das linguagens artísticas e na multiplicação dos processos pelos quais a não-arte devém arte.Há sempre o risco, em trabalhos como este, de a arte ser sufocada pela instrumentalização teórica. Dela servir como ilustração para uma sofisticada argumentação conceitual. Não é isso o que vemos aqui. Há um ir e vir entre conceitos e obras, uma provocação mútua que faz justiça ao título – ao modo pelo qual a esfinge pode ensinar algo a Édipo. Isso se dá na medida em que, convocados pela obra, deixamos de lado o significado e apostamos na instalação da significância.Partindo do que Lacan denominou de “limites da interpretação”, Juliana vai desdobrar a lição de Agamben “que propõe uma semiologia sob o ponto de vista da Esfinge, no qual o lugar do enigmático e do não-sentido seria resguardado”. Lição providencial, que mantém a arte sob a ótica experimental, convocando o espectador (e o leitor) para participar do trabalho interpretativo que fica sempre, citando Duchamp, definitivamente inacabado. Este livro de Juliana de Moraes Monteiro veio em bom momento – temos que nos educar diante do estranho e do infamiliar.
Luiz Camillo Osorio