Uma exposição de livros sobre gastronomia intitulada “Alimento da alma”, realizada no parque moscovita Tsaritsino, em 2014, foi dedicada a responder uma pergunta fundamental: é possível sentir o gosto da literatura? O evento, que pode se repetir em outros anos e outros países ou culturas, reuniu chefes e cozinheiros que tentaram refazer antigas receitas usadas por escritores clássicos russos, a exemplo de Nikolai Gógol, na tentativa de responder a esta pergunta fundamental, mostrando que a culinária também atraiu aos grandes mestres da literatura e que há uma profunda correlação entre o complexo universo literário e o gastronômico dos autores e dos seus personagens.No nosso caso vamos nos concentrar numa obra prima mesmo inacabada, Almas Mortas, de Gógol, publicada em 1842, como resultado de mais de 15 anos de trabalho, que teria sido planejada inicialmente em três partes e das quais só nos restou a primeira e os fragmentos da segunda, que podem conter de certa forma alguns trechos da terceira. O problema é que a partir da publicação do livro o autor passou a viver como andarilho, deprimido por uma crise existencial e religiosa na incessante busca da salvação da alma, até que em 1852 decide queimar num momento de delírio os manuscritos do segundo e do terceiro volume do romance, morrendo depois de inanição. Há uma lenda de que parte da obra teria sido salva pelo seu criado, ao desobedecer de certa forma às suas ordens insanas.