“[…] Eu sou o pai, eu estendo o linho na cama do filho que se foi e não voltará, e sobre a forma consagrada no tecido agrego o sândalo para maior êxtase da minha lembrança, fecho a janela e tranco a porta, prendo cada nuance do perfume pois você existe nele, filho, e uma segunda partida é absurdo inconcebível, irreparável abalo no alicerce da minha casa […]”
[…] Em nome do pai que eu sou, agrego na ponta dos meus dedos o meu amor e a minha dor, e permito que flutuem neste pequeno espaço que nos separa, filho, para se depositarem maciamente na superfície imóvel do seu peito. Se lá fora houvesse um sol eu tomaria você pelo braço e juntos caminharíamos pelas alamedas deste reino que nos rodeia e que tanto me assusta, pois tem um rumor neste silêncio, tem um tumulto subterrâneo nesta aparente paz, tem um conglomerado de solidões estacionadas debaixo do solo […]
[…] A minha mão estaciona sobre o seu peito, filho, e aqui eu sinto o relevo da gota de sangue coagulado, mas ainda úmido, esta pequena flor escura que lhe plantaram na noite anterior, na mesa de metal, e esta flor germina por entre meus dedos, enrosca-se nas cavidades das minhas veias e abre-se por inteiro para explodir na minh’alma como a mancha exuberante de uma humilhação […]”