O tema do dilúvio é o mais deslocado dos 46 livros do Velho Testamento. Diferente das outras narrativas primitivas, marca um ponto de virada na história da humanidade com os motivos de destruição e nova criação. O fato do Dilúvio ter sido um castigo pelo pecado humano é uma ideia que obviamente não é exclusiva da narrativa hebraica. Por outro lado, as narrativas primitivas parecem ter pouco interesse nas razões do Dilúvio, mas são em grande parte dedicadas a recontar como alguns poucos seres humanos escaparam da inundação e as dádivas recebidas por tal feito. A ideia de que o pecado humano encontra sua expressão no estado da sociedade, e que Deus responsabiliza os homens e a civilização por suas más ações, é revolucionária no mundo antigo. Mas qual foi o pecado capital da humanidade? Este livro segue a narrativa de inundação na mesma sequência profetizada: pecado, julgamento e mitigação da penalidade. Os mitemas de uma leitura antropológica estruturalista valem-se da análise do mito de Claude Lévi-Strauss. O pano de fundo psíquico do sentimento de desgosto e desamparo presente no dilúvio da esfera individual descende do Mal-estar na Civilização e Totem e Tabu de Freud. Por fim, o livro apresentada as três fontes de sofrimento humano e o conceito de estado de dilúvio tratando de intensificar a fantasia e variar as possibilidades poéticas para olhar, retomar e dar um eco singular à condição humana. A revelação do Dilúvio envolve valores específicos à condição humana em um expressivo simbolismo. Um estado individual; um dilúvio dentro de um dilúvio donde sairá o desacolhimento e o sobrevivente. Como permite a poética, uma gota existencialista que se sabe virtude em conhecer que é apenas uma gota miserável na vastidão do mar. Em seu nada, a gota se sente extinta. E por tomar consciência da sua irrelevância se torna a causa do dilúvio.