Minha hipótese de que vida e morte estão num páreo nas salas de parto veio até mim na minha morte, em setembro de 2014. Quando minha família foi estatística de morte materna, algo em mim morreu também. Algo nasceu, algo que eu não compreendia. Na minha mente se passavam diversas perguntas, questões de vida e de morte, questões médicas, científicas, religiosas e ideológicas.
Não era a dor do luto que falava naquele momento. Era algo além disso, uma vontade do tamanho do mundo de fazer diferente, um incômodo febril que pedia movimento.
O que morre e nasce na sala de parto vai muito além do que dizem os atestados de óbito de mães e crianças. Na maca pode morrer ainda a vontade ou a esperança de ter outro filho, a relação saudável entre a mulher e seu corpo, a relação entre pais e mães.
Morre a confiança no sistema de saúde, no plano de saúde, na equipe médica e muitas vezes mata-se ainda parte da relação mãe e filho, quando uma violência tão grande dificulta os cuidados e faz nascer uma mágoa referente ao momento do encontro de quem gerou e quem foi gerado. Morre a confiança de um médico, a certeza de uma enfermeira, morre a esperança de uma doula.
Mas disso tudo nasce a fé em algo maior do que toda essa dor, nasce ainda a vontade de resistir. Este livro é um ato afetivo e político de resistência, uma crença de mundo melhor para mães e filhos, e filhas que um dia se tornarão mães.