Muitos são os autores da jurema, assim como suas faces. Neste trabalho, reunimos um grupo notável de pesquisadores e cientistas brasileiros que já escreveram ou estão escrevendo sobre os fenômenos sociais e biológicos em torno do uso e conhecimento da jurema, especialmente no nordeste brasileiro. Todos os textos baseiam-se em pesquisas originais, com trabalhos de campo que validam os dados resultantes. Apesar do lado interpretativo que é essencial em qualquer trabalho primordialmente etnológico, verifica-se através de cada texto, que os autores se esmeraram no levantamento e análise dos dados e, assim sendo, foram capazes de chegar a traçar quadros sobre a realidade brasileira que inclui a jurema e que são extremamente semelhantes. Uma das coisas mais fascinantes que acontece ao se ler este conjunto de trabalhos é se deixar levar por um sentimento de deja vu, um estado de consciência através do qual nos dizemos freqüentemente que já havíamos lido, pensado e até mesmo vivido o que o autor a nossa frente nos diz. Isto tudo porque, apesar das muitas diferenças de linguagem, abordagem e origem social, existem e coexistem paradigmas sociais centrados na jurema que são semelhantes por terem sido criados ou recriados pelas mesmas raízes ancestrais da sociedade brasileira, com todas suas contradições e paradoxos, demonstrando que os atores sociais atravessam os mesmos caminhas em busca de suas identidades étnicas e nacionais, de seu pensar sobre a vida e o mundo.
“Com certeza não descobri a jurema, mas a jurema me descobriu. Como bem disse o pajé Kariri – Francisco Suíra – ela me mostrou muito mais do que o céu e a terra: ele me mostrou o Brasil místico e mistificado, de personagens do imaginário popular, tanto do sertanejo como do urbano atual mais pós-moderno. Ela me enriqueceu como o conhecimento de um grupo de gente que admitia ser “diferente”, que admitia ter um “poder” só alcançado através do enteógeno conhecido como jurema.” (Clarice N. Mota).
“A jurema, portanto, é mais do que uma planta: é representação, divindade, mulher, vinho. Assim sendo, todo um conjunto de crenças se lhe encontra associado. As plantas denominadas jurema ocupam, com efeito, um papel destacado na flora nordestina pela referência mágico-religiosa. No passado, foi condenada pelo colonizador europeu por ser considerada um perigoso ingrediente do qual se fabricava filtros demoníacos. Atualmente aparece na memória coletiva como a planta mágica capaz de conduzir o ser humano a experiências transcendentais que seriam, no entender dos não-iniciados aos cultos da jurema, como inimagináveis.” (Ulysses P. Albuquerque).