Os meios trovadorescos ibéricos do século XIII eram ambientes excepcionalmente abertos à crítica social, política e pessoal. Desde que através do discurso poético-satírico. nem mesmo o rei, que abria seu Paço para os espetáculos e saraus trovadorescos, escapou de algumas críticas bem-humoradas ou mesmo mais ácidas . Também a religião foi amplamente criticada por alguns dos poetas satíricos que constam nas páginas do cancioneiro galego-português. Examinaremos, neste ensaio, as cantigas medievais ibéricas que, produzidas neste ambiente, referem-se de uma maneira ou de outra à religiosidade, particularmente à religiosidade nas suas implicações como mecanismo de inclusão ou exclusão social. As críticas dos trovadores à religião, à estrutura eclesiásticas ou a seus representantes, como os padres locais ou o próprio Papa, constituem uma parte da análise. A crítica aos encontros de religiosidades – lembrando que a península Ibérica, neste período, era disputada por cristãos e islâmicos – é outro aspecto examinado. As cantigas blasfematórias ou heréticas, e também as críticas políticas disfarçadas na temática religiosa, dão margem a outra sessão de análise neste livro que procura examinar como os trovadores ibéricos tematizaram a religião e a igreja nas suas cantigas satíricas.