ERAM pontualmente seis horas da tarde. O sino da igrejinha local já tinha tocado as seis badaladas.Dia frio de inverno, já mais para noite que para dia, Lídia caminhava a passos rápidos em direção à sua casa, pois ainda tinha um bom pedaço pela frente.Toda encolhida pelo frio que passava por suas roupas e congelava até a alma, naquela hora, seu único pensamento era o chá quente e a cama acolhedora.Ao passar perto do riacho que contornava a longa estrada na direção de sua casa, Lídia ouviu uma voz melodiosa e triste que parecia vir do fundo da “caverninha” (era assim que todos chamavam o local, pois havia ali, ladeando o riacho uma pedra com pequena abertura, o que poderíamos chamar de pequena gruta).A voz era tão bonita, e o canto tão triste, mas tão triste, que Lídia, como todo ser humano, não resistiu a tentação da curiosidade e bem devargarinho foi se aproximando da caverninha. Lá, bem no fundo, uma luzinha muito tênue , mostrava uma linda moça, tão linda quanto sua voz. Lídia foi adentrando a caverna e aproximando-se cada vez mais...Ei moça! Quem é você? E o que faz aqui nesta noite de frio...A moça não respondeu, mas virou-se para Lídia e perplexa, ela percebeu que a moça de canto triste estava vestida de noiva, como se estivesse pronta para seu próprio casamento.Foi então que como num lampejo de memória Lídia lembrou-se: quando criança, numa roda de adultos, estas em que as pessoas do interior costumam contar “causos assombrados”, ela ouviu a lenda da mulher do véu branco. Era uma noiva que abandonada no altar, no dia do seu próprio casamento, correu desvairada para a pedra mais alta que beirava o riacho e de lá atirou-se. Alguns diziam já ter visto Iolanda, a mulher do véu branco, outras diziam só ouvir seu canto triste. Na época, Lídia perguntou à mãe se aquilo era verdade, mas a mãe respondeu-lhe que não, que era apenas mais um dos tantos causos que se contavam pela cidade. Muito católica, os anos passaram e Lídia não deu mais importância à história, até já havia se esquecido, porém, agora...Trêmula de medo, muito mais que de frio e pálida como vela, tentou fazer o caminho de volta, mas a cada passo que retrocedia, Iolanda, a noiva morta, avançava em sua direção, passos no ar, levitando, sem tirar os olhos de Lídia. O vestido branco estava encharcado e pelo véu, Lídia só conseguia ver seus olhos, vermelhos e brilhantes, como duas pedras de rubi.Então, Lídia não teve mais forças para continuar, o terror fez com que ela paralizasse. A um palmo do corpo de Lídia, a noiva parou. Apontou em sua direção e falou: agora numa voz mais sombria e tenebrosa que a escuridão da noite.“Lídia, Lídia, porque veio perturbar meu sossego? Eu estou de branco e você de preto, um dia todos vão lembrar e contar essa história. Chegue mais perto de mim.” Os olhos que pareciam hipnotizar Lídia, a levaram sem querer ao encontro de Iolanda, que tomou a outra num abraço e atirou-se com ela para o fundo do riacho.No outro dia, pessoas que passavam por ali, acharam o corpo de Lídia congelado e boiando, foi aberto inquérito, mas nada se apurou e todos acabaram pensando que como já era noite, a moça, sem querer, tropeçou em alguma pedra e caiu no riacho, que não era tão fundo, mas a temperatura da água, deve tê-la feito desmaiar e conseqüentemente se afogar.Muitos anos se passaram e até hoje, conta a lenda que dentro da “caverninha”, em noites de inverno intenso, depois das seis badaladas é possível vislumbrar dois vultos no interior da gruta: um de branco, e outro de preto, cujas melodias se entrelaçam num lamento eterno.Leia mais